(publicado no DP 18/8/89 e na revista Quinzena Rural, no 25, agosto de 89).
Caitano Oliveira Cintra
O homem passa, mas o nome fica. O teu nome ficou, Gonzagão, assim como ficaram os nomes dos grandes parceiros Humberto Teixeira, Zé Dantas e José Marcolino. O teu nome está gravado na memória do sertanejo porque cantaste o que ele sente e não diz.
Entre tantas Vozes da Seca, a tua foi (e ainda é) a mais afinada e a mais brilhante que cantou (e encantou) as belezas do Sertão de Aço, “… das muié sera dos homens trabaiador…” Tu foste à voz do sertanejo do norte, que, batendo a enxada no chão, plantou o Algodão, esse “… ouro branco que faz o nosso povo feliz e enriquece a nação…”.
“Deixaste o Pé de Serra do Araripe e viajando Légua Tirana por Caminho de Pedras, montando num Pau de Arara ou no Jumento nosso Irmão, foste parar no Rio de Janeiro de Meu São Sebastião. Lá chegando, pede para o Rio parar o samba dois minutos e ouvir o Baião”.
Para Ouvir Xaxado, Xamego, Xote e Baião, tocados por um Boiadeiro, com sua Sanfona Branca, numa Sala de Reboco ou ao redor de uma Fogueira de São João, feita de Lenha Verde de Juazeiro, não somente parou o Rio, parou todo o Brasil.
Foste O Andarilho, e com A Vida de Viajante que levaste, no Vira e Mexe do trem Mangaratiba ou no Chevrolet, alegraste milhões e milhões de brasileiros e mostraste com maestria que o Sertão sempre esteve presente e merece respeito.
Este ano o Mandacaru “fulorou” na seca e o inverno foi bom. Madroceu o Milho, mas nem o São João na Roça, nem o São João nas Capitá foram um São João Quente, porque não participaste com a Sanfona do Povo. Estavas hospitalizado, pedindo a proteção da Beata Mocinha e de Nossa Senhora da Penha.
Do hospital, só saiste no dia 2 de agosto, para fazer uma viagem que, no lugar de alegria, trouxe muitas tristezas. Foi uma Triste Partida.
Agora não apenas O Urubu é um triste, mas triste é, também, todo sertanejo. O Sabiá, o Acauã e o Assun Preto calaram-se. A Cantiga do Vém-vem, ninguém mais ouviu e a Asa Branca bateu asas novamente. O galo de campina voou do Cajueiro Velho e percorre calado pela Estrada de Canindé ouvindo a Ave Maria Sertaneja que, a cada dia, está mais melancólica.
As águas da Cacimba Nova, do Riacho do Navio e do Rio Brígida gelaram e nenhum surucucu ou cascavel da Fazenda Serrote Agudo procurou abrigo no Buraco do Tatu. Foi realmente um Fim de Festa.
Na madrugada daquele 2 de agosto, percebendo Não da(r) mais prá segurar, Olha(s) pro Céu, vês Jesus Sertanejo e dizes: Já Vou(.)Mãe, avisa a Januário, O Maior Tocador, para acender um Cigarro de Paia e reunir Lulu Vaqueiro, Cego Aderaldo, Chico Valente, Ana Rosa, Marilu, Orélia, o Padre Sertanejo, José Marcolino, Zé Dantas e Humberto Teixeira, O Doutor do Baião, porque Amanhã Eu Vou, Eu e Meu Fole, para, juntos, Na Cabana do Rei, tocarmos um Forró Fungado e um Baião de Dois, recordando Meu Araripe e contemplando, lá de cima, o Crepúsculo sertanejo e o Luar do Sertão.
O sertanejo teve a Volta da Asa Branca, mas não terá o Regresso do Rei. Tua voz estará sempre presente no sertão e será “… a mesma voz de quando o (teu) reinado começou…”
Hoje, é muito comum ouvirmos milhares de sertanejos dizerem: O Eterno Cantador, na Hora do Adeus desta Triste Partida, Nem Se Despediu de Mim.
Com tua morte, Gonzaga, o Céu ganhou mais uma “Lua”, e o nordeste perdeu um “Rei”. Inconformados com “tamanha judiação”, os nordestinos vivem a dizer: Saudade Dói.