Luiz LUA Gonzaga

Jornada de amizades e dedicação

Para Bené Fonteles, além de viagens e da pesquisa, o livro foi feito a partir da admiração de todos os colaboradores pela obra de Luiz Gonzaga. Ideia é sedimentar legado do artista nas novas gerações

Igual a milhões de meninos, Bené Fonteles conheceu o som de Luiz Gonzaga por meio das canções que animavam as festas juninas no Interior. Em "Eu e o Rei", um de seus textos no livro, o organizador conta sobre o início de sua amizade com o Rei do Baião, em 1972, quando lhe apresentou o material do espetáculo teatral "Luiz Lua Obrigado", de sua autoria. A peça falava de da importância do sanfoneiro para a MPB. "Fiz uma entrevista na ocasião para o Tribuna do Ceará, a minha primeira. Depois foram muitas aventuras com ele pelo País. Em 1983, ele participou do meu disco ´Bendito´ com um aboio, o único registrado fonograficamente. Fiz o projeto para o Museu do Baião em Exu e muitas outras coisas que o faziam me chamar de ´filho postiço´", recorda Fonteles.

A elaboração do livro demandou muitas viagens, entre o Ceará, Pernambuco e João Pessoa. "Entrar no sertão profundo onde ele se originou para conhecer quem o conheceu e o ama de verdade. Foi uma sincronia de fatos e amizades feitas que ajudou na pesquisa, com gente que faz tudo por grande admiração e amor a sua pessoa generosa e sua obra inigualável", elogia o organizador.

Em relação à escolha dos pesquisadores e colaboradores para o livro, Bené explica que não bastava a relevância acadêmica ou artística de cada um. "Tudo passou pela profunda admiração e amor que eles têm a Luiz Gonzaga. Eles teriam que iluminar mais o terreiro para que o Rei tivesse seu reino tornado ainda mais vasto e mais belo no cenário cultural do Brasil. Fui pelo viés também da antropologia cultural, por isso a escolha de Antônio Risério e Hermano Vianna. Também pela questão da sociologia cultural com Sulamita Vieira, ou da musicologia por Elba Braga Ramalho, ou pelo conhecer profundo da cultura popular do Nordeste com Gilmar de Carvalho, nosso renovado Câmara Cascudo. E Gil, nem se fala, por que só Dominguinhos transparece maior influencia e fluência sobre a obra de Gonzaga do que ele", ressalta.

Para Bené, é justamente pela análise dos vários ensaístas, que o livro ultrapassa a documentação, expandindo o trabalho de Gonzaga produzido entre as décadas de 40 e 80 – "momentos em que sua música e suas atitudes, principalmente até os anos de 1960, ditaram moda e um jeito nordestino de ser para os brasileiros", explica em seu próprio ensaio, "Grande Sertão, Gonzagas". "Ele fez muito por vários artistas e pelo seu público humilde de nordestinos migrantes, numa ´operação inversa´ de trazer o Nordeste ao cenário nacional. Espero que as novas gerações tenham neste livro uma referência e a percebam a real importância de sua força e coragem criativa".

Além dos ensaístas, fotógrafos e xilogravuristas, há um colaborador que não consta no índice, mas cujo trabalho foi importante para a realização de "O Rei e o Baião". Paulo Vanderley responde no livro pelo cargo de "consultor para assuntos gonzagueanos". Não por acaso. Bancário e pesquisador independente nas horas vagas, é idealizador e responsável pelo principal website na internet sobre Luiz Gonzaga, considerado também um dos sítios mais completos sobre um artista brasileiro. "Muitos dizem que é preciso uns seis dias para conhecer todo o conteúdo", contabiliza Paulo.

Internet

O http://www.luizluagonzaga.mus.br já tem quatro anos de existência. "Mas passei cinco anos reunindo material, então aí já vai quase uma década. Adiei muito começar um trabalho dedicado a Luiz Gonzaga, porque sua obra é grande demais", confessa o consultor, que começou, na verdade, com um website sobre o filho do mestre, Gonzaguinha. "Criei quando tinha 17 anos", recorda.

Hoje com 31, Paulo continua na função de bancário, mas neste mês, em função das festividades "gonzagueanas" Brasil afora, tirou férias para dar conta do trabalho paralelo.

"O site não tem financiamento de nenhum tipo. Banco tudo do próprio bolso, faço por amor", revela. O espaço é dividido em notícias, biografia, letras (com ferramenta de busca), fotografias, vídeos e discografia (78RPM, LPs, jingles e gravações com amigos). Importante ressaltar que todas as músicas listadas podem ser ouvidas, constituindo uma impressionante "biblioteca musical online" de Gonzaga.

"O site ajuda na busca por informações. Todo dia recebo e-mails de pessoas querendo colaborar. Há anos, rodo o Brasil atrás de material sobre ele, ando sempre com um notebook, scanner e HD externo. Hoje tenho cerca de duas mil imagens", calcula Paulo. "Cheguei a digitalizar matérias de 400 revistas das décadas de 40, 50 e 60, como Radiolândia, Revista do Rádio e O Cruzeiro. Minha ideia é publicar 100 delas, comentadas, em um livro de depoimentos sobre Gonzaga, que estou preparando junto com o poeta cearense Xico Bezerra", adianta o pesquisador. "Terá ainda as capas de todos os discos dele, em tamanho real".

Paraibano, Paulo morou dez anos em Fortaleza e está há dois em Recife. Começou a colecionar material relacionado a Luiz Gonzaga ainda criança. Entre os sete e oito anos de idade morou na cidade natal do ídolo, período no qual teve a oportunidade de conhecê-lo. "Meu pai era gerente do Banco do Brasil em Exu, e chegou a comprar um carro de Luiz Gonzaga. Também ajudou muito o Gonzaguinha na organização do Museu do Gonzagão", recorda.

Além da revisão de conteúdo do livro, Paulo também cedeu fotografias e resenhas sobre o Mestre Lua. "Conheci-o através do amigo Armando Almeida, que me falou de um cabra da peste que mais sabia de Gonzaga e tinha um site maravilhoso sobre o Rei. Fui atrás dele ligeiro para conseguir coisas fundamentais que enriqueceram muito o livro. A Paulo sou muito grato, como a muitos outros, a exemplo de José Nobre, do Museu Fonográfico Luiz Gonzaga, em Campina Grande, ou da Lêda Dias, do Memorial Luiz Gonzaga em Recife", destaca Bené Fonteles.

Mais do que a competência, é a admiração pessoal dos colaboradores por Luiz Gonzaga, aliada à riqueza de abordagens, que tornam "O Rei e o Baião" obra de referência sobre o universo sertanejo (re)criado pelo sanfoneiro. Mas, acima de tudo, o livro prova quão estapafúrdia é qualquer noção de separatismo do Sul-Sudeste em relação ao Nordeste, e revela a ingenuidade risível de preconceitos em relação ao povo da região.

Cinebiografia do rei a caminho

Atualmente, Paulo Vanderley está envolvido com um trabalho de consultoria para o filme "Gonzaga, de pai para filho", cinebiografia focada na relação entre o sanfoneiro e seu filho, o cantor e compositor de MPB Gonzaguinha. A direção é de Breno Silveira, jovem cineasta que se tornou conhecido ao fazer um bom filme com a trajetória da dupla sertaneja Zezé di Camargo & Luciano, "2 Filhos de Francisco" (2005). A previsão de estreia do longa "Gonzaga" é 2012, ano do centenário do Mestre Lua.

"Ele ganhou este apelido porque tinha o rosto redondo. A alcunha ficou popular depois que Paulo Gracindo (ator, 1911 – 1995), em programa da Rádio Nacional, o apresentou como Luiz ´Lua´ Gonzaga, nos anos 50", revela o estudioso.

Nesse momento, Vanderley também está prestando consultoria para o centro cultural Cais do Sertão Luiz Gonzaga, cuja ordem para o início das obras foi assinada no última terça-feira, dia, pelos então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro da Cultura, Juca Ferreira. O projeto é resultado de uma parceria entre o Ministério da Cultura (MinC), o Governo Estadual de Pernambuco e o Porto de Recife. O orçamento previsto é de R$ 26 milhões, sendo R$ 21 milhões de responsabilidade da União.

"Mais que um museu, mais que um memorial em homenagem a Luiz Gonzaga, o Cais do Sertão será um centro de referência da cultura nordestina", explicou o ministro. O equipamento cultural que vai funcionar no Armazém 10, no Porto de Recife, será o primeiro museu nacional "hi-tech" e de alto porte em Pernambuco. Valendo-se de recursos multimídia e tecnologias interativas, o centro cultural tem por objetivo primeiro destacar a importância de Luiz Gonzaga para a cultura e o imaginário brasileiro.

Fique por dentro
O início da trajetória

Luiz Gonzaga nasceu na pequenina Exu (PE), em13 de dezembro de 1912, segundo dos nove filhos do casal Januário José dos Santos e Ana Batista de Jesus. Com apenas oito anos de idade, substitui um sanfoneiro em festa tradicional na cidade e recebe cachê; o dinheiro amansa o espírito da mãe, que não o queria músico. Antes dos 16 anos, já era conhecido no Araripe e redondezas. Em 1929, ameaçado pelo pai da moça pela qual se apaixonara e surrado pelos pais, foge de casa. Segue para Fortaleza e se alista no exército, o qual deixa dez anos depois. No Rio de Janeiro inicia a carreira artística divertindo marinheiros e desocupados na antiga zona do Mangue. Em 1941, por indicação do apresentador de rádio Ary Barroso, participa de uma gravação. Nos anos seguintes grava dezenas

de discos instrumentais 78 rpm. Inicia na Rádio Clube do Brasil no programa Alma do Sertão. Começa a fazer sucesso nas emissoras e em 1945 grava seu primeiro disco, tocando e cantando.

Fonte: http://www.luizluagonzaga.mus.br